
LIANE ABDALLA

BIOGRAPHY
The Body of the Landscape, the Time of Matter
Curatorial Text on Liane Abdalla
The Body of the Landscape, the Time of Matter
Curatorial Text on Liane Abdalla
The Body of the Landscape, the Time of Matter
Curatorial Text on Liane Abdalla
The Body of the Landscape, the Time of Matter
Curatorial Text on Liane Abdalla
The Body of the Landscape, the Time of Matter
Curatorial Text on Liane Abdalla
Há artistas cuja obra é um gesto de resistência ao apagamento. Liane Abdalla é uma delas. Sua poética emerge como uma arqueologia do invisível, uma escuta paciente das camadas de tempo que habitam os materiais mais elementares: folhas ressecadas, pigmentos de terra, madeiras esquecidas, papéis que carregam o peso da história e da erosão.
Longe de qualquer idealização romântica da natureza, Liane articula um discurso visual que tensiona o orgânico e o político, o efêmero e o permanente, o gesto íntimo e a memória coletiva. O que para muitos seria resto, para ela é matéria inaugural: elemento vivo de um processo onde o fazer artístico é também um ato de cura, escuta e transformação.
Cada obra de Liane Abdalla carrega a inscrição de um tempo outro — um tempo que escapa à cronologia linear e se aproxima da geologia, do ciclo das marés, da lenta oxidação dos metais, da decomposição natural. Seu trabalho desafia a velocidade da era digital, convocando o espectador a um estado de atenção, quase de suspensão.
Há em seu processo uma ética do cuidado. Um respeito radical pela integridade dos materiais, pelo ciclo da vida e da morte que eles contêm. Seus desenhos e pinturas, muitas vezes construídos em camadas sucessivas, funcionam como mapas afetivos, cartografias de um corpo expandido que se confunde com a paisagem.
Ao trazer para o campo da arte elementos do chão, da floresta, do ar, Liane desfaz hierarquias entre o natural e o cultural. Sua obra questiona: o que escolhemos preservar? O que permitimos desaparecer? Como podemos reinventar narrativas diante de um planeta em colapso?
Ao habitar esse território liminar entre gesto e permanência, Liane Abdalla reafirma o lugar da arte como espaço de escuta, reinvenção e resistência. Suas obras não são objetos prontos: são processos em aberto, convites à contemplação ativa, espaços onde o espectador é chamado a coabitar o intervalo entre matéria e memória.
Ivo Satt - novembro/2023
The Body of the Landscape, the Time of Matter
Curatorial Text on Liane Abdalla
A natureza de Liane Abdalla não remete apenas à natureza-natural, ou à presença de traços puros, intocados pela cultura. A natureza de seus trabalhos também é uma forma de dizer sobre si, é a natureza compreendida como os traços particulares de alguém, como a essência, como a personalidade, como aquilo que é único e pessoal.
Não é apenas uma oposição ou negação da natureza-natural, mas uma busca ou um processo de reencontro com essa natureza, que remete aquilo que é próprio de si mesma. Esse procedimento se evidencia em sua série “Florestas”, em que a artista recria cenas e paisagens de bosques e árvores com pequenos pontos. Essa é uma tarefa que requer uma temporalidade contemplativa, desacelerada. A imagem vai se formando aos poucos, nesses encontros de pequenas partes. O todo é apenas uma impressão (como em um remonte à arte impressionista).
O depósito da tinta com o ponto, esse primeiro elemento formal, a menor partícula indivisível, a origem das demais formas, expressa essa busca da artista pela essência das coisas. Um ponto será, eternamente, um ponto, pois não existe nada que o antecede. A compreensão dessa gênese é importante para o trabalho de Liane Abdalla, que irá reviver essa busca em outros momentos, como em suas obras que remetem à arqueologia brasileira, e ao mundo ancestral das pinturas e do grafismo. É um retorno ao sujeito, mas também um retorno histórico à gênese da produção artística.
Esse procedimento é igualmente muito bem explorado em sua série “In Natura”. Como essa artista nômade que retorna as origens da expressão humana, Liane Abdalla decide criar e compor com as coisas que encontra pelo seu caminho, incorporando em suas obras folhas secas, galhos, sementes etc. O resultado final desse procedimento me remete as colagens cubistas.
Já em sua série de pinturas de paisagens, a artista aproxima-se de uma linguagem onírica, introduzindo um mecanismo de acesso ao inconsciente, nas camadas menos conhecidas do Eu. São sonhos, fantasias, talvez delírios que se permitem descolar da realidade e da concretude para viver (e vivenciar) horizontes de possíveis.
Ainda ligada às estruturas mentais e aos pensamentos, visualizo em sua série “Linhas” um encontro com as experiências concretas e as trajetórias de vida. As imagens dos sulcos das árvores, que revelam seu tempo e sua história, ou os caminhos das águas de um rio, também são analogias ao percurso e a história de vida da artista, e a construção do seu Eu.
Na arte de Liane Abdalla, a natureza é um caminho, uma ponte para que a artista encontre e narre sua própria história. É menos uma leitura literal sobre árvores, flores e paisagens, e mais sobre o que esses elementos podem indicar a respeito da sua trajetória, da sua personalidade.
Curador Lucas Benatti / 2021